Pedro Coelho (CESAM/DBio) Discute o Projeto LIFE SeagrassRIAwild e o Futuro das Pradarias Marinhas na Ria de Aveiro

O CESAM foi saber mais sobre o projeto LIFE SeagrassRIAwild, coordenado pelo investigador Pedro Coelho.

Numa entrevista exclusiva, foram discutidas as motivações que levaram à conceção do projeto, o seu potencial impacto na preservação das pradarias marinhas na Ria de Aveiro e a visão para os próximos sete anos.

Acompanhe esta entrevista e saiba mais sobre este projeto.

CESAM: Quais foram os motivos e a inspiração por trás da criação da proposta que deu origem ao projeto LIFE SeagrassRIAwild?

Pedro Coelho: A proposta LIFE SeagrassRIAwild surge no seguimento de vários anos de trabalho da equipa nesta temática (nomeadamente os projetos RemediGrass, ReMoliço BioPradaRia e C-Grass), onde foram abordados diversos aspetos relacionados com a ecologia, o restauro de pradarias marinhas e a sua utilização como uma solução baseada na natureza na reabilitação de ecossistemas, ainda que com foco na espécie dominante na Ria de Aveiro, a Zostera noltei. Em paralelo, foram identificadas recentemente pequenas manchas de Zostera marina no braço de Mira, após décadas em que esta espécie não foi observada no sistema. A presença da Zostera marina sugere que as condições ambientais atuais da Ria de Aveiro serão propicias ao seu restabelecimento, e justificou um primeiro projeto (FITA) com o objetivo de desencadear ações para a sua proteção e recuperação.

Simultaneamente, a importância do restauro ecológico de ecossistemas tem ganho realce a nível internacional, quer a nível europeu (O European Green Deal, a estratégia para a Biodiversidade 2030 e a estratégia de adaptação às alterações climáticas, bem como a futura Lei Europeia de Restauro Ecológico) quer a nível mundial (Década das Nações Unidas para o Restauro Ecológico), originando mais oportunidades de financiamento.

Tendo em consideração a atual recetividade política, o ressurgimento natural da espécie no sistema e a sua importância histórica e ecológica para a Ria de Aveiro, considerámos que esta era a altura certa para avançar com um projeto de restauro deste habitat a larga escala no sistema.

CESAM: Qual é a magnitude do contributo que esperam que este projeto tenha na recuperação e conservação das pradarias marinhas na Ria de Aveiro?

Pedro Coelho: O projeto LIFE SeagrassRIAwild propõe uma mudança de paradigma para o restauro ecológico das pradarias de ervas marinhas, não só na Ria de Aveiro mas a nível global, pela utilização do conceito de maricultura (cultivo em condições controladas, em antigas marinhas de sal da Universidade de Aveiro que serão reconvertidas para o efeito), que servirá como fonte de biomassa e sementes necessárias para a implementação de programas de recolonização em larga escala, sem provocar impactos em planícies dadoras.

Iremos promover o envolvimento da academia, autoridades locais, agências ambientais nacionais, ONG’s, associações de utilizadores e cidadãos no processo de cocriação e implementação das soluções e ações de restauro, para incrementar a aceitação, envolvimento e investimento de todos os atores locais no projeto. O objetivo é que o processo de recuperação das pradarias marinhas da Ria de Aveiro não seja apenas um projeto científico da academia, mas um projeto e movimento de toda a região, com uma grande base de ciência cidadã.

Por último, o projeto pretende contribuir não apenas para o restauro ecológico das pradarias marinhas, mas potencialmente colocar estas comunidades ao serviço da população, ao explorar soluções baseadas na natureza inovadoras para a gestão da navegabilidade dos canais de acesso a cais e marinas que, se eficazes, terão potencial para integrar os processos de rotina de portos, marinas e autoridades de gestão e potencialmente minimizar as necessidades de dragagem que se verificam atualmente. 

CESAM: Daqui a 7 anos, qual é o cenário que esperam ter alcançado como resultado deste projeto, em termos de impacto e mudanças nas áreas de pradarias marinhas?

Pedro Coelho: Os objetivos a que nos propusemos são ambiciosos, mas baseados na qualidade e experiência do consórcio. Estimamos conseguir colonizar uma área de 12 hectares com Zostera marina, divididos em 8 Ha no interior das marinhas e 4 Ha nos diversos canais da Ria. O objetivo será a expansão destas áreas após os 7 anos do projeto com base no legado do projeto, nomeadamente a infraestrutura da maricultura e a rede de voluntariado estabelecida.

Em paralelo, estimamos um impacto positivo das ações do projeto a diversos níveis. Em primeiro lugar na biodiversidade local, com especial foco em espécies ameaçadas como os cavalos-marinhos ou a enguia, intimamente associadas às pradarias marinhas. Por outro lado, tendo em consideração o papel relevante das pradarias marinhas na fixação de carbono, estimamos que a área transplantada poderá fixar até cerca de 30 toneladas de CO2 por ano, uma significativa contribuição para a redução da emissão de gases de efeito de estufa. Por último, prevemos que a presença de corredores verdes de ervas marinhas ao longo das margens de canais de navegação sirva como um filtro de partículas e reduza as taxas de assoreamento destes canais, minimizando a necessidade de dragagens e efeitos negativos associados.

CESAM: Muito obrigada pela sua participação nesta entrevista e por partilhar esta informação sobre o LIFE SeagrassRIAwild. Esperamos, no futuro, partilhar algumas iniciativas e resultados no âmbito deste projeto.