As aves marinhas são importantes predadores oceânicos, e representam um consumo anual que se aproxima do total de capturas das pescas. Por serem relativamente fáceis de estudar, são cada vez mais usadas como indicadores da qualidade dos ambientes marinhos, designadamente para avaliar os efeitos das alterações climáticas. As pescarias interagem com as aves marinhas de várias formas (e.g. fornecendo alimento através de rejeições ao mar, competindo pelos recursos, alterando a estrutura das comunidades e causando uma mortalidade muito expressiva em engenhos de pesca). Por estes e outros motivos, muitas espécies de aves estão globalmente ameaçadas, sendo por isso cada vez mais um elemento importante em abordagens ecosistémicas à gestão pesqueia e também usadas na definição de áreas protegidas marinhas. Contudo, a utilização das aves marinhas na monitorização e gestão dos oceanos é contingente a um conhecimento profundo das suas respostas à variação ambiental. Com esta proposta pretendemos obter uma compreensão detalhada acerca 1) dos factores que determinam as estratégias de alimentação dos albatrozes-de-sobrancelha Thalassarche melanophris, 2) dos mecanismos através dos quais esses factores operam e 3) das implicações das estratégias de cada indivíduo na demografia e, em última análise, na sobrevivência da população.
Neste projecto capitalizaremos sobre uma população de albatrozes das ilhas Falkland que temos estudado desde há 6 anos, e em relação à qual temos dados detalhados sobre comportamento e demografia. Nestas condições, propomo-nos utilizar tecnologias muito recentes de seguimento remoto de aves e de análise da informação que permitam aumentar o conhecimento desta espécie emblemática na plataforma Patagónica.
Numa primeira fase, desenvolveremos novos métodos para estudar o grau de interacção entre as pescarias e os albatrozes.
Pretendemos utilizar modernos registadores automáticos de posições GPS e registadores de imersão e de temperatura superficial das águas (SST) para obter informação detalhada sobre os movimentos e actividade das aves. Utilizaremos também dados de localização (GPS) dos navios de pesca (VMS – vessel monitoring system), e diários de bordo electrónicos, de modo a obter informação equivalente sobre a actividade de pesca nas águas das Falkland. Esta zona é muito invulgar (mas muito adequada para o nosso objectivo) uma vez que todas as embarcações de pesca são monitorizadas através de VMS. Utilizando métodos analíticos como “firsttime passage”, iremos criar ferramentas de identificação dos padrões de movimento das aves quando associados a embarcações de pesca. Este método permitirá o estudo da interacção entre aves e pescarias mesmo na ausência de dados de localização destas últimas.
Esta abordagem será complementada com comparações entre a assinatura isotópica das rejeições das pescas e a da dieta “natural” dos albatrozes. Utilizando estudos tradicionais de dieta, medições de isótopos e modelos mistos, esperamos quantificar o grau de interacção entre as aves e as pescarias, ao nível individual e populacional. Com estas ferramentas estudaremos também a influência do sexo, idade, morfologia e especialização na variação inter-individual nas estratégias alimentares dos albatrozes. A especialização individual tem sido muito pouco estudada em aves marinhas, e a sua
importância para compreender a associação com as pescarias nunca foi abordada. Avaliaremos também a segregação das áreas de alimentação de indivíduos provenientes de colónias vizinhas, com diferentes graus de sobreposição das suas áreas potenciais de procura de alimento. Mais uma vez, trata-se de um aspecto muito pouco estudado, mas fundamental para compreender o papel da competição intra-específica na distribuição das colónias e dos indivíduos.
A informação de localização e da actividade das aves será também usada para criar uma compreensão integrada dos padrões
espacio-temporais envolvidos na busca de alimento pelos albatrozes na plataforma Patagónica, aspectos muito relevantes para a gestão marinha. A distribuição das aves será modelada através de SIGs e de modelos lineares mistos em função de variáveis como a SST, vento, concentração de clorofila-a, batimetria, dados de pescarias e distância à colónia.
Finalmente, avaliaremos as consequências das estratégias de alimentação dos albatrozes e as interacções com a variabilidade
ambiental. Algumas questões que abordaremos incluem: (a) a especialização afecta os indicadores de fitness (dimensão do ovo, crescimento e sobrevivência da cria, condição corporal do adulto)?; (b) o grau de especialização varia em função da variação anual das condições ambientais (SST, disponibilidade de rejeições ao mar)? (c) que parâmetros (demográficos, ecológicos, fisiológicos, comportamentais) estão melhor correlacionados com as variáveis ambientais e com alterações rápidas das condições físicas do oceano (e que, por isso, produzirão informação mais relevante para a monitorização ambiental)?