Ao longo do último século a paisagem tem sofrido alterações à larga escala, e de forma acelerada, devido essencialmente às actividades humanas, que podem resultar na ocorrência de populações animais cada vez mais pequenas e isoladas e, deste modo, mais vulneráveis à extinção local. Uma das formas mais comuns de modificação da paisagem é a construção de vias de comunicação (estradas e vias férreas). O desenvolvimento da rede viária tem sido acompanhada pelo aumento da mortalidade por atropelamento, degradação e perda de habitat, que limita o acesso e disponibilidade de alimento, abrigo e espaço, fundamentais para a sobrevivência das espécies. Embora a maioria dos mamíferos do Mediterrâneo não apresentem preocupações em termos de conservação, a expansão da rede viária e a intensificação do volume de tráfego coloca novas ameaças que devem ser avaliadas de forma a minimizar esses efeitos e promover a viabilidade das populações a longo prazo. As diferenças nas adaptações morfológicas, ecológicas e comportamentais das espécies de mamíferos, podem traduzir diferentes sensibilidades ao impacte do tráfego rodoviário. Os pequenos mamíferos constituem bons modelos para avaliar esses impactes, uma vez que utilizam uma grande variedade de recursos, apresentam tempos de geração curto, que permitem uma rápida detecção do efeito das alterações ambientais e, geralmente respondem às perturbações de forma perceptível e mensurável. Por outro lado, os carnívoros possuem características (p.e, baixas densidades, grandes áreas de território, baixa taxa de reprodução) que podem torná-los particularmente vulneráveis aos efeitos das alterações da paisagem induzida pelo homem. Nos últimos anos, um número crescente de estudos descrevem alguns efeitos das estradas nos pequenos mamíferos e nos carnívoros, mas a falta de informação detalhada limita a definição de estratégias adequadas para o desenvolvimento de uma rede viária ambientalmente sustentável para este taxa. O principal objectivo deste estudo é a analise dos efeitos das estradas quer, no comportamento como na estrutura genética dos mamíferos Mediterrânicos a nível individual e populacional, nomeadamente, de três espécies com diferentes requisitos ecológicos (rato-de-água Arvicola sapidus, rato-cego-mediterrânico Microtus duodecimcostatus). Mais especificamente, queremos (a) avaliar a resposta comportamental de espécies em relação às estradas, analisando os padrões de movimento e a dimensão e forma dos seus territórios, e (b) analisar o efeito de barreira, estimando o fluxo genético e a descrevendo estrutura genética das populações que ocorrem na vizinhança de estradas com diferentes volumes de tráfego. Estas análises permitirão identificar os efeitos negativos destas vias na comunidade de pequenos mamíferos, e definir as medidas mais adequadas para evitar, minimizar ou mitigar esses efeitos. A captura-recaptura, o rádio-seguimento, os transectos e as análises moleculares serão métodos utilizados para alcançar os objectivos propostos. A captura-recaptura irá fornecer indivíduos para o rádio-seguimento, informação sobre a abundância das espécies a diferentes distâncias da estrada e, também, amostras de tecidos para a análise genética. O rádio-seguimento permitirá obter dados sobre os padrões de movimento e a dimensão e forma dos seus territórios na proximidade das estradas. A avaliação da forma como as espécies respondem às estradas e ao tráfego a uma escala mais fina, permitirá identificar os factores que explicam os comportamentos de atracção ou repulsa e, deste modo, as medidas que devem ser considerados no planeamento das estradas. As amostras de tecido fornecidas pelas capturas e os dejectos de carnívoros recolhidos ao longo dos transectos serão a fonte de DNA para a análise genética. Esta abordagem irá descrever os padrões genéticos e espaciais, e sobretudo explicar os processos que resultam dos padrões identificados, analisando a influência das componentes estruturais e funcionais das estradas na diversidade genética das espécies. A estreita parceria entre as principais instituições portuguesas de transporte e a nossa equipa permitirá partilhar os resultados com os gestores das estradas e, deste modo, desenvolver uma série de recomendações para serem implementadas a curto e longo prazo e, contribuir para a definição de uma estratégia de conservação dos mamíferos na Península Ibérica.