A Poluição crónica, para além dos efeitos negativos na fisiologia dos organismos tem demonstrado ser um factor que causa reduções na variabilidade genética de populações de várias espécies. Segundo os conceitos da teoria evolutiva, esta perda de diversidade genética pode por sua vez reduzir o potencial das populações em termos de adaptação a alterações ambientais. Em ecossistemas fortemente modificados pela acção humana, a poluição ambiental está frequentemente associada à destruição/fragmentação dos habitats que contribui também para o isolamento de populações, “inbreeding e reduções da diversidade genética. É assim importante investigar os efeitos de reduções da diversidade genética na resposta ao stress químico.
Os estudos ecotoxicológicos necessitam de ter em consideração não apenas os efeitos imediatos da poluição tais como as alterações nos parâmetros de história dos organismos, mas também os efeitos a longo prazo tais como a erosão genética. Isto é de especial importância dado que os organismos expostos a stressores químicos necessitam de encetar processos de defesa e reparação para subsistir. Estes processos são dispendiosos em termos energéticos e como tal podem ter consequências negativas em termos de “fitness”. Uma vez que a erosão genética causada pela poluição conduz a uma redução do potencial evolutivo, é também de extrema importância avaliar as consequências evolutivas dessas alterações na diversidade genética das populações. Isto inclui a avaliação dos custos de “fitness” de adaptação genética em condições óptimas mas, e talvez mais importante dado que as populações naturais estão sujeitas aos efeitos combinados de múltiplos stressores naturais e antropogénicos, expostos a alterações das condições ambientais. Para além disso é necessário perceber os mecanismos fisiológicos responsáveis pelas diferentes respostas e susceptibilidades à contaminação das populações naturais de locais contaminados e de referência.
Os recentes avanços nos métodos genéticos e moleculares permitem hoje uma avaliação da variabilidade genética de populações de uma forma robusta e com boa relação custo benefício. Este desenvolvimento tecnológico levou ao aparecimento da chamada toxicologia evolutiva que estuda os efeitos da contaminação ambiental na variabilidade genética de populações naturais. No entanto, investigações integrativas que permitam o estabelecimento de ligações mecanicistas entre contaminação, variabilidade genética, fisiologia dos organismos e custos de “fitness” associados à adaptação genética, são raros ou inexistentes. Investigação nesta área é assim extremamente necessária uma vez que apenas combinando abordagens genéticas, fisiológicas e de história de vida se pode obter uma melhor compreensão dos efeitos dos stressores nas populações.
Este projecto vem responder a esta lacuna estudando os efeitos de contaminação nos processos microevolutivos de populações naturais de Chironomus riparius. Pretendemos responder a duas questões essenciais:
– Qual o efeito da poluição na diversidade genética de populações naturais de C. riparius?
– Estão as populações de C. riparius de locais contaminados adaptadas à poluição?
– Quais a s consequências evolutivas em termos de custos de “fitness” dessas alterações na variabilidade genética causadas por poluição.
Assim a variabilidade genética de populações oriundas de locais contaminados e de referência será avaliada utilizando a variação de sequências mitocondriais e análises de microsatélites nucleares. O estudo dos processos de adaptação genética em C. riparius será realizado através de ensaios laboratoriais de ciclo-de-vida realizados com diferentes linhagens obtidas de locais contaminados e de referência. Estas linhagens serão expostas a contaminantes e a stressores naturais e vários parâmetros serão medidos em diferentes níveis de organização biológica. Estes testes laboratoriais irão avaliar as susceptibilidades das diferentes populações aos contaminantes e alterações das condições ambientais. Para além disso, testes multigeracionais irão ser também realizados para avaliar os processos de adaptação e a perda de variabilidade genética de populações ao longo de várias gerações. Os efeitos na diversidade genética são não-específicos relativamente aos mecanismos de acção e ao mesmo tempo sensíveis relativamente aos efeitos permanentes dos contaminantes nas populações. Sem surpresa, as medidas de erosão genética têm sido recentemente propostas como “o” biomarcador de efeito sendo que a sua utilização em ecotoxicologia contribuirá para uma melhor compreensão dos efeitos ecológicos da exposição crónica a stressores químicos. Focando-se nos efeitos de contaminantes na variabilidade genética de populações naturais, o projecto MIDGE irá contribuir para o desenvolvimentos de novas abordagens de biomonitorização e fornecer as bases científicas para metodologias integradas de avaliação de risco ecológico, essenciais para uma efectiva estratégia de conservação ambiental.