A bioenergia (energia obtida a partir da biomassa) tem vindo a ser proposta como solução para vários problemas, tais como a segurança no abastecimento de energia, as emissões de gases com efeito de estufa e o desenvolvimento rural. Contudo, o aumento verificado na procura de bioenergia tem sido acompanhado por uma preocupação crescente com os seus impactes ambientais, económicos e sociais, tais como desflorestação, competição com alimentos e conflitos de ocupação do solo. A avaliação do desempenho ambiental dos sistemas bioenergéticos tornou-se assim alvo de investigação e debate importantes por parte da comunidade científica.
Este projeto incide sobre o desafio de desenvolver uma metodologia que permita estabelecer uma ferramenta para a Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) dos sistemas bioenergéticos, capaz de informar os stakeholders e apoiar a gestão destes sistemas. A modelação da cadeia de produção e utilização da biomassa com fins energéticos engloba o cultivo e colheita da biomassa e o seu transporte e conversão em produtos bioenergéticos e co-produtos, bem como a deposição/tratamento de resíduos e a produção e uso de produtos subsidiários (produtos químicos, combustíveis, etc.).
A metodologia proposta pretende contribuir para a inovação e avanço do estado da arte em três linhas correlacionadas:
1) A ACV contabilizará os efeitos indiretos da Alteração do Uso do Solo (AUS) que ocorrem quando o uso da biomassa induz AUS em outras áreas. Estes efeitos têm vindo a ser negligenciados na maioria dos estudos, que se limitam a analisar os efeitos diretos. Deste modo, é fundamental realizar uma modelação consequencial dos sistemas bioenergéticos selecionados, que serão também comparados com os modelos atribucionais dominantes nas ACV destes sistemas. A estrutura de modelação a ser desenvolvida, bem como os casos a serem estudados, permitirão avaliar e discutir diferentes sistemas e cenários, contribuindo assim para o debate atual sobre o modo de modelar e avaliar os efeitos indiretos da AUS dos sistemas bioenergéticos e sobre as opções de modelação em ACV, nomeadamente, atribucional e consequencial.
2) A análise de sistemas bioenergéticos alternativos será baseada no uso complementar da Análise de Decisão Multi-Critério (ADMC) e da ACV, acompanhando a recente tendência de utilizar a ACV para obter um subconjunto de critérios a utilizar na ADMC. Isto permitirá integrar diferentes critérios, nomeadamente impactes ambientais, económicos e sociais. As ferramentas de ADMC serão utilizadas para definir um conjunto coerente de critérios que representem os interesses dos stakeholders. Serão utilizadas metodologias ADMC recentes baseadas em informação parcial sobre parâmetros de preferências. Tal visa ultrapassar a redutora (e por vezes formalmente incorreta) estratégia de considerar “pesos” iguais ou propostos por omissão, bem como proporcionar conclusões robustas face a diferentes fontes e tipos de incerteza. Na realização da ADMC para obter resultados para os casos específicos a serem estudados, a equipa estará ao mesmo tempo a contribuir para avançar o estado da arte na combinação da ACV com ADMC.
3) A análise de incerteza estará presente em todos os modelos que serão desenvolvidos, constituindo um aspeto importante já que existe incerteza considerável no que respeita ao tipo, escala e tempo dos efeitos indiretos da AUS. Os estudos de ACV de sistemas bioenergéticos raramente consideram a incerteza no seu todo tendo em conta as suas diversas fontes e tipos. Os resultados publicados apresentam grandes variações, quer devido a diferenças nos dados e cenários, quer devido a diferentes escolhas normativas na modelação. Pelo contrário, neste projeto será modelada não só a incerteza e variabilidade associada aos parâmetros mas também a incerteza associada aos cenários a analisar, relacionadas com as escolhas normativas na modelação. Será também considerada a incerteza associada a parâmetros relacionados com a preferência obtidos na ADMC. Estes diferentes tipos de incerteza serão avaliados por aplicação de análise de robustez e do método de Monte Carlo. A inovação metodológica reside na consideração de diferentes tipos de incerteza e na utilização da análise de incerteza para focar a recolha e obtenção da informação naquilo que é mais relevante para o processo de tomada de decisão, com base em sucessivos refinamentos dos modelos.